red shoes

Sentia frio as quartas-feiras e brincava de se fingir de morta aos domingos. Só usava sapato vermelho, ate mesmo nas tardes santas. E sempre entregava margaridas para completos estranhos, desde que eles lhe sorrissem com os dentes. Andava pulando, e certa vez tropeçou no caminho. Os machucados duraram dias, os joelhos ficaram carne viva, mas ela continuou saltitando. Não se sabia se era porque isso lhe deixava feliz, ou se era por teimosia de andar como todo mundo. A coisa mais bonita era seu nariz, arrebitado como de criança de cinco anos. A mais feia era seus cotovelos, que por mais que esfregasse não deixavam de ser mais escuros que o resto do corpo. Na vida tinha certeza de duas coisas: a) sexta-feira é dia de usa chapéu e b) nunca confie em pessoas magras demais, elas não comem por um motivo, e nunca é um bom motivo.

Contava ate 30, nunca mais que isso. E sempre andava com bolinhas estampadas nas blusas, saias ou vestidos. Nunca usava calça (a não ser em datas extremamente especiais, como o dia do vendedor de dicionários). Costumava inventar seus próprios horóscopos, e mentia toda vez que encontrava uma menina de blusa laranja e pulseira verde ou um menino com calças amarelas e mãos roídas. Um dia decidiu deitar em baixo de um arvore e olhar nos olhos da única pessoa que escondia segredos, e assim eles acabaram sendo descobertos. Decidiu fazer um vídeo suicida porque gostava de se despedir das pessoas, constantemente. Trocou todos os seus vícios por um só: café sem açúcar.

Tinha uma voz fina e sempre falava:

- Eu te amo menos do que você deseja e mais do que eu poderia suportar.

Um dia parou de falar.